Festival de Almada 1993
Festa do teatro anima ruas e palcos A Capital, 24 de Junho de 1993
A vontade de tornar o Festival um local de encontro de linguagens tornou-se particularmente evidente durante a X edição do Festival. Nesse ano, a programação colocou lado a lado clássicos como Shakespeare, Ésquilo e Gil Vicente, e produções de grupos amadores, como o Grupo de Intervenção Teatral da Trafaria, o Grupo Teatral de Freamunde, e o Grupo de Teatro da Universidade Técnica de Lisboa. A maioria das sessões decorreu na Escola D. António da Costa, que se tornaria um palco indispensável. Ao nível da programação, a grande novidade desse ano foi a primeira co-produção do Festival de Almada com uma companhia estrangeira: Ensayos para siete, de Boguslaw Schaeffer, com encenação de Jaroslaw Bielski. Tratou-se de um espectáculo co-produzido com o Centro Nacional de Nuevas Tendencias Escenicas, contando ainda com a colaboração do Centro Dramático Nacional de Espanha e com o Festival de Otoño de Madrid. Outro passo em frente na programação foi a produção de Entre tinieblas, la función, uma adaptação cénica do filme Negros hábitos, de Pedro Almodóvar, “que atraiu a Almada mais lisboetas do que é habitual”, como escreveu Manuel João Gomes no Público de 20 de Julho. Foi ainda visível o aumento do público jovem, que constituiu, nesta edição, 60 por cento
do total, como referiu João Gomes no mesmo artigo.
Espectáculo de Honra
Espectáculos
Coração d’lagoa, de Boaventura Cardoso. Encenação de Gilberto Mendes. Teatro Gungu – Moçambique
A ilha, de Athol Fugard, John Kani e Winston Ntshona. Encenação de Ademir Ferreira. Serpente – Angola
Bastille Bastringue. Encenação de Jean Marie Sirgue. Théâtre de la Fronde – França
El burgués gentilhombre, de Molière. Encenação de Arturo Castro. Teatro Margen – Espanha
Cuarteto para cuatro actores, de Boguslaw Schaeffer. Encenação de Jaroslaw Bielski. Compañía de Teatro Nuovo – Espanha
Entre tinieblas, la función, de Pedro Almodóvar e Fermin Cabal. Encenação de Fermin Cabal. Primer Paso – Espanha
Viaggio organizzato, solo andata (prima classe). Teatro dei Manicomics – Itália
Persas, de Ésquilo. Encenação de Theodoros. Terzopoulos. Attis Theatre – Grécia
Azul, bleu, blue, de Carlos Gongora. Axioma Teatro – Espanha
A verdadeira história de Barbie, de José Pinto Correia. Encenação de Alexandre de Sousa. Cassefaz
Bão. Texto e encenação de João Mota. A Comuna
Teatro, poesia e conversa, de vários autores. Encenação de Carlos César. Teatro de Animação de Setúbal
Uma floresta de enganos, de Gil Vicente. Encenação de Hélder Costa. A Barraca
Ensayos para siete, de Boguslaw Schaeffer. Encenação de Jaroslaw Bielski. Compañía de Teatro Nuovo – Espanha
Othello, de William Shakespeare. Encenação de Joaquim Benite. Companhia de Teatro de Almada
Alta vigilância, de Jean Genet. Encenação de Carlos Avilez. Teatro Experimental de Cascais
Sorte malvada!, de Ruzzante. Encenação de José Peixoto. Teatro da Malaposta
Dias felizes, de Samuel Beckett. Encenação de Julio Castronuovo. Companhia de Teatro de Almada
Medeia, de Eurípides. Encenação de Yolanda Alves. Teatro de Papel
Todos somos suspeitos, de vários autores. Encenação de Vítor Azevedo. Grupo de Intervenção Teatral da Trafaria
Roberta, de Romeu Correia. Encenação de Fernando Santos. Grupo de Teatro de Freamunde
A boda dos pequenos burgueses, de Bertolt Brecht. Encenação de Armando Caldas. Intervalo – Grupo de Teatro
Para onde foram os pedreiros…, de vários autores. Encenação de Jorge Listopad. Grupo de Teatro da Universidade Técnica de Lisboa
O festival promove uma intensa animação paralela, cria espaços de reflexão e debate (destaquem-se o seminário de Theodoros Terzopoulos sobre a tragédia grega clássica e o debate sobre cultura cigana e racismo), volve, este ano, o seu olhar para África, recebendo grupos de Moçambique e Angola que, apesar dos maus dias que se vivem naquelas paragens, trazem através do teatro, mensagens de esperança ao futuro das suas pátrias.
A Capital, 24 de Junho de 1993
Romeu Correia
personalidade homenageada
Da arte de escrever de Romeu Correia apontou Mário Sacramento: “o seu teatro nasceu com os pés no chão: fruto de uma experiência concreta do real, reflexo vivo de um meio caracterizadamente popular, trabalho probo e exacto de um homem que só descobriu o seu talento literário depois de ter calcorreado caminhos bem ásperos e árduos”. A sua obra é vasta: peças de teatro, romances, contos, biografias. E prémios: Prémio da Crítica (1962); Óscar de Honra da Casa da Imprensa (1962); Prémio da Imprensa Regional (1965); e Prémio Ricardo Malheiros. É talvez hoje o decano da escrita de teatro em língua portuguesa.
Virgílio Martinho