Festival de Almada 1987
Milagre em Almada Manuel Rio-Carvalho, Jornal de Letras, 27 de Julho
Na sua IV edição, a Festa de Teatro de Almada viu o número de sessões subir para 26, realizadas nos palcos da Boca do Vento, do Pátio Prior do Crato, da Academia Almadense e da Incrível Almadense . Este é um ano a assinalar: pela primeira vez, a Festa apresenta cinco produções estrangeiras. Verificase um grande peso do teatro experimental, denotando uma preocupação em sair dos circuitos teatrais dominantes. O Jornal de Letras de 6 de Junho apontava que: “O objectivo principal deste festival almadense é a descentralização. Pretende-se fazer uma mostra de companhias provenientes de zonas de descentralização, ou que se caracterizem por uma prática de itinerância. Desta política de descentralização faz parte a abertura da festa, pela primeira vez, a companhias estrangeiras”.
Espectáculo de Honra
Espectáculos
Carlota Corday, de vários autores. Encenação de Etelvino Vázquez. Teatro del Norte – Espanha
Olhares de perfil, de vários autores. Encenação de Roberto Cordovani. Arte Livre – Brasil
Os emigrantes, de Stawomir Mrozek. Encenação de Jean Christophe Gravouille e Jean Claude Lebreton. Le Globe – França
Toreros, majas y otras zarandajas. Criação colectiva. Teatro Margen – Espanha
Arte de morrer, de vários autores. Encenação de Kasimiers Grochmalski. Teatro Maya – Polónia
Os polícias, de Slavomir Mrozeck. Encenação de Hélder Costa. A Barraca
O diabinho da mão furada, de António José da Silva. Encenação de Hélder Costa. A Barraca
Humilhados e ofendidos, de André Charpak. Encenação de Armando Caldas. Primeiro Acto
Histórias de Hakim, de Norberto Ávila. Encenação de Carlos Cabral. Marionetas de Lisboa
Um cálice de Porto, vários autores. Encenação de Norberto Barroca. Seiva Trupe
Um Gil duplo, a partir de Gil Vicente. Encenação de Moura Pinheiro. TEAR
Mário Gin-Tónico, a partir de Mário Henrique Leiria. Encenação de Mário Viegas. Teatro Experimental do Porto
Roque à presidência, de Rui Costa Lopes. Encenação de Carlos Fogaça. Teatro da Nova
Socorro… sou uma mulher de sucesso. Io Appolloni
Auto da Floripes, teatro tradicional. Aldeia das Neves
Três peças em um acto, de vários autores. Encenação de Mário Viegas. Teatro Experimental do Porto
Afonso VI, de Fonseca Lobo. Encenação de Joaquim Benite. Companhia de Teatro de Almada
ALMADA: TEATRO NA BOCA DO VENTO
Diário de Lisboa, 3 de Julho
O TEATRO É SÓ ISTO: NATURAL
Diário de Lisboa, 18 de Julho
Talvez tenha sido essa participação [do público] o que na festa houve de mais surpreendente, tanto mais que esse público era constituído por espectadores com raros contactos com o teatro, a não ser este e o da televisão.
Carlos Porto, Diário de Lisboa, 31 de Julho 1987
Dir-se-ia que houve um milagre em Almada, tal o consumo eufórico de teatro que por ali pairou.
Manuel Rio-Carvalho, Jornal de Letras, 27 de Julho 1987
Luzia Maria Martins
personalidade homenageada
Num simples tópico, apontaria apenas três características que parecem definir Luzia Maria Martins em particular: primeiro, toda a lucidez de um teatro conforme o verdadeiro realismo crítico; segundo, a nobre persistência de nunca ter pactuado com concessões compensatórias; terceiro, uma coragem sem limites defronte seja de quem fosse. Neste teor de inteligência, de carácter, de férrea vontade, Luzia Maria Martins ficará (porque é) uma personagem exemplar. Em determinada fase do teatro português ela assumiu-se como a mais viva voz. Particularmente nos anos que antecederam o Portugal restaurado do 25 de Abril, a aventura do seu Teatro Vasco Santana deixou para o futuro a memória de uma autêntica gesta. Quantas vezes a vi (a ela e à co-fundadora da sua Companhia do Teatro Estúdio, Helena Félix) confrontar-se com os estúpidos e arbitrários rigores de uma censura mutilante do espírito, lutando para impor um autor ou uma peça – e sempre assim e a troco de todos os escolhos e dificuldades que as entidades da administração pública se compraziam em opor-lhe.
Fernando Luso Soares