Festival de Almada 1986
III FESTA DE TEATRO DE ALMADA: UM FESTIVAL PARA AS NOITES QUENTES Diário Popular, 3 de Julho
Para a III edição da Festa de Almada foram utilizados espaços diversificados, todos eles em Almada Velha: o Pátio Prior do Crato, o Teatro da Academia Almadense, o Palco dos Tanoeiros e o Palco da Esplanada (Boca do Vento). O número de sessões aumentou de 19 para 24. Nesta edição, é de frisar a reafirmação da abertura do Festival de Almada a grupos de zonas mais afastadas (como o TEAR, do Porto, ou o Teatro Laboratório de Faro). A presença de Lisboa é também mais forte, representada no Festival por seis companhias. A maioria dos espectáculos foi realizada ao ar livre, nos já mencionados recantos de Almada Velha, indo ao encontro da vontade de os revitalizar. Apesar dos apoios concedidos, é importante referir que o Festival tinha uma base sólida de voluntariado, tornando visível um forte espírito de comunidade, e reforçando a ideia de que este é, com efeito, um Festival da Cidade. Como salientou Joaquim Benite ao Diário de Lisboa (1 de Julho), a Festa “só se pode organizar com a boa vontade das companhias e de toda uma série de pessoas que se dispuseram a colaborar. É de frisar a ajuda sempre dada pelos jovens e pelos habitantes das zonas onde vão ser montados os palcos, que chegam a acolher os participantes em suas casas”.
Espectáculos
A vida do grande D. Quixote de La Mancha, de António José da Silva. Encenação de Helena Vaz. Marionetas de S. Lourenço
Corcunda por amor, de Almeida Garrett. Encenação de Castro Guedes. Teatro Estúdio de Arte Realista
Bom dia palhaço, de Carlos Pinhão. Encenação de António Assunção. Companhia de Teatro de Almada
George Dandin, de Molière. Encenação de Joaquim Benite. Companhia de Teatro de Almada
O morgado de Fafe em Lisboa, de Camilo Castelo Branco. Encenação de Ruy de Matos. Teatro Nacional D. Maria II
Farsa de Inês Pereira, de Gil Vicente. Encenação de José Peixoto. Centro Cultural de Évora
A ilha dos escravos, de Marivaux. Encenação de Joaquim Benite. Teatro Borda d’Água
Auto da Índia, de Gil Vicente. Encenação de Isabel Pereira e João Soromenho. Teatro Laboratório de Faro
O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá, de Jorge Amado. Encenação de José Caldas. Teatro Amador de Intervenção
Josef K, de Kafka. Encenação de Alberto Lopes. Cénico de Direito
Comando para a morte, de Alfonso Sastre. Encenação de João Barros. GOTA
Calamity Jane. Encenação de Hélder Costa. A Barraca
Um dia na capital do império, de António Ribeiro Chiado. Encenação de Hélder Costa. A Barraca
Mário Gin-Tónico, a partir de Mário Henrique Leiria. Encenação de Mário Viegas. Teatro Experimental do Porto
Comédia dos Anfitriões, de Luís de Camões. Encenação de José Valentim Lemos. Teatro Experimental de Leiria
Afonso Henriques, de João Brites. Encenação de João Brites. O Bando
Coro da Academia de Amadores de Música. Direcção de Fernando Lopes-Graça
O rei da vela, a partir de Oswald de Andrade. Encenação de Hermínio Fernandes. Grupo de Teatro da Sociedade Guilherme Cossoul
PARECE QUE FOI A SÉRIO
Este jornal foi feito no meio de terriveis convulsões, terramotos, guerras, epidemias (o fotógrafo ficou de braço ao peito: uma tendinite), entre outras tragédias assaz diabólicas. Perdão e também um pouco de ordem.
Foi dentro deste caos absoluto que este germen do Jornal da Festa se desenvolveu e saiu para a rua. Não é talvez a melhor altura para balanços (são altas horas da madrugada, já se acabou o café, a redaccão esta esgotada) e eu aproveito a desatenção que existe relativamente a mim para esgotar as minhas últimas forras neste último artigo. Foi, realmente, um esforço impressionante concluir este jornal nos termos em que foi feito.
Parece até que foi a sério. Gente nas ruas a apontar tudo o que via e ouvia, entrevistas a toda a gente, inclusive às vedetas e para-vedetas. Recolhem-se amostras para a elaboração de sondagens. Eu sei lá o que se fez mais. Mas lembro-me do bater das máquinas de escrever, dos nervos, das fúrias, dos choros, dos gritos, dos cigarros queimados.
Valeu a pena: o jornal está feito e todos nós, redactores, podemos voltar à calma, ao marasmo, que agora ambicionamos. E depois? Tornaremos nós, os que vivemos esta experiencia vibrante, a cair no tédio?
Chega de palavras. Aqui, à vista de todos, está aquilo a que nós chamamos «jornal». 0 nosso primeiro jornal.
Miguel Martins
Um corrupio de forasteiros invadiu as ruas, os restaurantes e sobretudo a Escola Preparatória D. António da Costa. Público heterogéneo e indistinto, actores, técnicos e críticos dos quatro cantos do Mundo reuniram-se graças ao teatro. Com o diálogo como base, esta festa das artes cénicas serviu também de ponto de encontro para curiosos de todas as idades e credos.
Rita Bertrand, A Capital, 19 Julho 1986
Assis Pacheco
personalidade homenageada
Cremos não haver outro actor nos nossos dias que reúna prestígio igual ao do homenageado desta Festa de Teatro. Com mais de meio século dedicado à arte dramática, e tendo contracenado com várias gerações de comediantes, Assis Pacheco é incontestavelmente o decano dos actores portugueses. Artista dos mais prestigiosos deste século, o actor e o homem têm sido uma constante no mesmo sentimento de fraternidade. Se procurássemos uma simples frase para melhor definir este actor, talvez a de que não há pequenos papéis para grandes comediantes se lhe ajustasse como uma luva. Quantas vezes admirámos em Assis Pacheco o talento de transformar um obscuro papel no melhor desempenho da peça!
Romeu Correia